Fisco quer responsabilizá-los por dívidas das empresas que acompanham: Gestores de falências perdem primeira batalha legal contra as Finanças

Intimados a responsabilizarem-se pelas dívidas fiscais das empresas insolventes, que são nomeados aleatoriamente para acompanhar, os administradores de falências avançaram para a justiça, interpondo uma providência cautelar contra o Ministério das Finanças.

O tribunal decidiu a favor do fisco, numa batalha que ainda só vai no primeiro round. A associação que representa estes profissionais já recorreu da decisão.

Os administradores de insolvência, cuja função é gerir os processos de empresas que foram declaradas incapazes de cumprir as obrigações financeiras, têm vindo a ser responsabilizados pelas dívidas das sociedades. São notificados para pagarem dívidas fiscais, sujeitos a contra-ordenações e constituídos arguidos.

A Direcção-Geral de Impostos suporta o envio dessas notificações na Lei Geral Tributária e no Código de Procedimentos de Processo Tributário, que definem aqueles profissionais como "responsáveis subsidiários", que, "na falta ou insuficiência de bens do devedor" e no caso de "o pagamento não ser efectuado dentro do prazo", são responsabilizados.

Nas notificações a que o PÚBLICO teve acesso, os administradores são executados por "reversão fiscal". Um processo que determina que os responsáveis subsidiários devem responder pelo incumprimento de terceiros, uma vez terminados os procedimentos de execução fiscal contra o devedor originário. Para o fazer, o fisco apoia-se na Circular 1/2010, despachada pelo ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Carlos Lobo.

Foi precisamente contra esta circular que a Associação Portuguesa dos Administradores Judiciais (APAJ) interpôs uma providência cautelar, em meados de Setembro. Isto porque, no documento, a liquidação judicial de uma sociedade é equiparada às liquidações normais, obrigando as empresas insolventes e cumprir obrigações em sede de IRC e de IVA e responsabilizando os administradores de insolvência.

"Um ataque à profissão"

Na providência cautelar, à qual o PÚBLICO teve acesso, a associação pedia a "suspensão de eficácia" da circular, argumentando que os deveres que estão a ser imputados aos gestores de falências "não decorrem de qualquer norma legal prevista no Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE)", que regulamenta este tipo de processos.

A APAJ alega que o facto de os serviços das Finanças estarem a "responsabilizar directamente" os administradores de insolvência "tem sido ofensivo dos seus interesses". E acrescenta que o documento despachado pelo secretário de Estado é, "além de ilegítimo e ilegal, claramente inconstitucional", classificando-o como "um ataque à profissão" e "apenas compreensível numa lógica de angariação cega de receitas".

O pedido de providência cautelar, interposto para travar o fisco de "accionar livremente o património dos administradores de insolvência pelas coimas e outras dívidas fiscais", baseou-se, em termos jurídicos, na eficácia externa da circular, pelo alegado impacto na profissão.

Providência indeferida

O Ministério das Finanças opôs-se, argumentando que as circulares "são actos meramente internos" e, por isso, não são "susceptíveis de lesar interesses ou direitos particulares ou colectivos". Suportando-se na necessidade de harmonizar e simplificar as regras do CIRE, o fisco considera que "a ponderação equilibrada entre interesses públicos e privados não pende a favor" da APAJ, incitando, inclusivamente, a associação a agir, caso a caso, sempre que entender que algum profissional for lesado.

Depois desta troca de argumentos, que inclui ainda o exercício do contraditório por parte da APAJ, o Tribunal Central Administrativo do Norte decidiu não adoptar a providência cautelar. A decisão, tomada no início de Dezembro, foi suportada no facto de, ao contrário do que a associação defendia, a circular "não ter eficácia externa, uma vez que não produz directamente efeitos na esfera jurídica dos administradores de insolvência", lê-se no acórdão.

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FONTE: PUBLICO
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