Preterição de formalidades essenciais no acto tributário " A falta de fundamentação " Posição da Jurisprudência

I. Considerações Gerais

O acto tributário é em si mesmo um acto administrativo, e está por isso sobre a alçada dos princípios gerais do Código de Procedimento Administrativo ("CPA"), como certo se estatui, ainda que ressalvado pelo princípio da subsidiariedade, no artigo 2.º alínea d) do Código do Procedimento e Processo Tributário ("CPTT").

Ainda, reforçando a remissão legal acima exposta, dispõe a Lei Geral Tributária ("LGT") de uma disposição paralela que determina a aplicação das regras do CPA às relações jurídico-tributárias (artigo 2.º alínea c) da LGT).

Pelo que, sem prejuízo de subsequentes considerações, deve a fundamentação integrar a estrutura do acto do acto tributário (cfr. artigo 123.º n.º 1 CPA) sempre que, o referido, total ou parcialmente (i) "Negue, extinga, restrinja ou afecte por qualquer modo direitos ou interesses legalmente protegidos, ou imponha ou agrave deveres, encargos ou sanções" " sublinhado nosso (ii) "Decida reclamação ou recurso" (iii) "Decida em contrário de pretensão ou oposição formulada por interessado, ou de parecer, informação ou proposta oficial" (iv) "Decida de modo diferente da prática habitualmente seguida na resolução de casos semelhantes, ou na interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou preceitos legais" (v) "Implique revogação, modificação ou suspensão de acto administrativo anterior" (cfr. artigo 124.º n.º 1 alíneas a) a e)).

Também sobre o dever legal de fundamentar que impende sobre a Autoridade Administrativa (e/ ou Tributária), dispõe o artigo 77.º da LGT.

Face a inferências jurídicas recentes, quer na jurisprudência, quer na doutrina, podemos declarar que a montante do dever de fundamentação se colocam os seguintes princípios orientadores: (i) garantia de um procedimento decisório correcto, na medida em que se pugna pelo explanação das razões por que a Administração decidiu de uma forma e não de outra; (ii) reflexão e ponderação no sentido em que deve a autoridade administrativa colocar ao dispor do particular, e porventura destinatário do acto, a análise dos argumentos em confronto; a saber que, afinal, o que se pretende é garantir é a (iii) transparência da actividade administrativa.

Pelo exposto, aponta a Doutrina quatro requisitos essenciais que devem orientar a fundamentação do acto tributário, a saber que deve a mesma ser:

a) Clara, sob pena de não serem perceptíveis as motivações do agente ao praticar o acto ou seleccionar o seu conteúdo;

b) Congruente, devendo o conteúdo do acto indicar uma conexão lógica com os fundamentos invocados;

c) Suficiente, de forma a apontar as razões que levaram a autoridade administrativa a agir de um modo e não de outro[1];

d) Expressa

A omissão dos requisitos supra mencionados, ou a adopção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareça, concretamente, a motivação do acto equivale à falta de fundamentação.

II. Posição da Jurisprudência

Sobre tal pronuncia-se o Supremo Tribunal Administrativo[2], (?) "O que quer dizer que a insuficiência, a obscuridade e a contradição da fundamentação equivalem a falta de fundamentação, porque essas insuficiência, obscuridade ou contradição impedem o devido esclarecimento" (?).

Sendo certo que o dever de fundamentação se considera cumprido se efectuado através da emissão de declaração sumária, (?) " podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integram o relatório da fiscalização tributária." (?)[3], não pode pois ser ignorado o facto de a fundamentação dos actos tributários (?) " dever sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo." (?).[4]

III. Cominação Jurídica para a omissão do Dever de Fundamentação

A omissão do dever de fundamentação constitui a preterição de uma formalidade essencial, gerando uma ilegalidade fundamento de anulação do acto.

A anulabilidade é, nos termos do CPA, o desvalor regra para os actos praticados com ofensa dos princípios ou normal jurídicas (cfr. artigo 135.º CPA); A nulidade é pois o desvalor excepcional, resguardado para os actos que enfermem dos vícios elencados no art. 133.º do CPA.

Muito embora à partida pareça de incluir a preterição da formalidade em questão na alínea d) do artigo 133.º do CPA, por aplicação do artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa, a Jurisprudência dos Tribunais Administrativos é unânime a considerar que o desvalor aplicado é o da anulabilidade.

Notas:

[1] In Acórdão Supremo Tribunal Administrativo, P 742/03 de 26-05-2004 (?) "A fundamentação é, assim, como a jurisprudência vem repetindo, um conceito relativo que varia em função do tipo legal de acto que visa responder às necessidades de esclarecimento do Administrado, procurando-se através dela informá-lo do itinerário cognoscitivo e valorativo do acto e permitir-lhe conhecer as razões, de facto e de direito, que determinaram a sua prática e porque motivo se decidiu num sentido e não noutro" (?) (sublinhado nosso)


[2] In Acórdão Supremo Tribunal Administrativo, P 742/03 de 26-05-2004


[3] Lei Geral Tributária, Artigo 77.º, n.º 1


[4] Lei Geral Tributária, Artigo 77.º, n.º 2

FONTE: EXPRESSO EXAME
AUTOR: JOANA TAVARES

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