Eficácia no combate à evasão fiscal no IRC está ao nível da década de 90

Ao fim de duas décadas, permanecem todos os indícios de uma elevada evasão fiscal na tributação das empresas. Os números mais recentes de IRC, relativos apenas a 2007, mostram os riscos para os quais os dirigentes da administração fiscal alertavam há 15 anos.

Quatro situações, abordadas na altura como um sinal de fragilidade na cobrança futura do IRC, mantêm-se, apesar das diligências legais entretanto adoptadas. A cobrança continua fortemente concentrada num número reduzido de grandes empresas e as pequenas e médias empresas revelam sinais de estar a contribuir fortemente para a evasão fiscal. Depois, a receita de IRC está condicionada por uma aparente subfacturação das sociedades ou por expedientes de planeamento fiscal, que tendem a aproveitar as regras legais para reduzir os rendimentos que deveriam ser tributáveis. Finalmente, cresce o número de empresas com prejuízos e o seu volume dos prejuízos fiscais, que tendem a delapidar os lucros futuros (e a receita de IRC), através do reporte dos prejuízos nos anos seguintes.

Em 1994, só um terço das cerca de 200 mil sociedades pagava IRC. Para 2007, apenas 36 por cento das 379 mil empresas declararam ter actividade suficiente para pagar IRC. Os números podem ser, todavia, maiores. Cerca de 15 por cento das sociedades pagaram o famoso pagamento especial por conta (PEC), apesar de declararem não ter tido actividade de molde a pagar imposto. E as estatísticas do IRC ainda referem (em nota de rodapé) que há contribuintes cujo PEC foi superior ao IRC a liquidar, mas que o fisco não sabe quantos são. Ou seja, mesmo com o PEC, cerca de metade das empresas nada pagou.

Em 1994, metade da receita de IRC foi paga por 123 sociedades. Em 1995, as duas maiores empresas, que eram públicas, entregaram um quarto da receita de IRC desse ano. Só 158 sociedades - com um volume de negócios aproximadamente superior a 5 milhões de contos (25 milhões de euros) - pagaram 59 por cento da receita de IRC.

Passados quase 20 anos, as estatísticas deixaram de divulgar a receita paga pelos maiores contribuintes. Mas as sociedades com um volume de negócios próximo do que valeriam na altura os 5 milhões de contos mantiveram quase a mesma percentagem de IRC cobrado - 56 por cento. Os grandes contribuintes continuam a ser objecto de acompanhamento constante por parte da administração fiscal, dado a receita de IRC assentar neles.

No outro lado está um imenso universo de micro, pequenas e médias empresas que pouco contribuem para o Estado. Em 1995, cerca de 96 por cento das cerca de 200 mil sociedades (até 500 mil contos de facturação) pagavam 17 por cento da receita de IRC. Em 2007, os mesmos 96 por cento do total das empresas (até 2,5 milhões de euros de proveitos) pagavam 21 por cento da receita desse exercício.

Esse grupo de sociedades, grossomodo, passou em 15 anos de uma colecta média anual por empresa de 2060 euros em 1994 para 2117 euros em 2007. Ou seja, descontada a inflação desses 15 anos, houve um decréscimo efectivo da contribuição média de cada empresa.

A leitura que os dirigentes da altura faziam era a de que a evasão começava com as empresas a subavaliar a facturação. A situação parece não se ter alterado. Em 1994, mais de 85 por cento das empresas declaravam ter menos de 100 mil contos anuais de facturação e mesmo dois terços abaixo de 30 mil contos. Passados quase 15 anos, cerca de 62 por cento declaravam um volume de proveitos (superior à facturação) de 150 mil euros. E 83 por cento até 500 mil euros anuais. E mesmo com esses valores subavaliados, ainda havia forma de a facturação não se transformar em matéria colectável. Em 1997, cerca de 60 por cento das sociedades existentes tinham tido resultados positivos. Mas apenas 36 por cento tinham pago IRC. Dez anos depois, o retrato pouco mudou. O peso no total das empresas que tiveram resultados positivos até baixou - de 60 para 57 por cento do total. Mas as que entregaram IRC ao Estado continuaram a ser 36 por cento. E houve mesmo 54 mil entre as 173 mil empresas que pagaram PEC que o fizeram sem ter apurado imposto a pagar. Ou seja, nesse caso, o PEC funcionou como uma espécie de "colecta mínima", criada na década de 90 para combater a forte evasão fiscal.

Apesar de tudo, a evolução da matéria colectável no conjunto das empresas tem crescido. Passou de 1057 milhões de euros em 1995 para quase 19 mil milhões de euros em 2007. Mas na década de 90 os dirigentes fiscais pensavam que essa evolução poderia ser bem maior. Isso devido ao crescimento das deduções fiscais e do reporte de prejuízos. O mesmo acontece agora.

Os prejuízos fiscais, no entendimento do fisco, acabam por ser uma dupla perda de receita fiscal, porque as empresas podem abater resultados futuros com os prejuízos passados. Só este ano o Parlamento aprovou uma medida que visa reduzir de 6 para 4 anos o número de exercícios que se podem usar para abater resultados. E percebe-se porquê.

Em 1995, considerava-se elevado um volume de prejuízos de 352 milhões de contos (quase 2 mil milhões de euros). Mas em 2000 já eram 6400 milhões de euros. E em 2007 atingiram os 9557 milhões de euros. Entre 1989 e 1996, registou-se um total de 35 mil milhões de euros de prejuízos fiscais (78 por cento do lucro tributável no período). De 1997 a 2002, passaram para 52,9 mil milhões (56 por cento do lucro tributável). E só nos cinco anos de 2003 a 2007 somaram 44 mil milhões (37 por cento do lucro tributável).

A manutenção de uma situação indiciadora de evasão fiscal ao longo de década e meia pode ser um sinal de que a administração fiscal não está a conseguir moralizar, apesar das correcções pela inspecção cujos valores não entram nestes números.

O PÚBLICO questionou o Ministério das Finanças sobre as razões por que se mantém, ao longo pelo menos de década e meia, esta situação de forte evasão fiscal, por que tem sido tão difícil atenuar este padrão e que medidas legais se deveriam adoptar. Os responsáveis do Ministério das Finanças remeteram a resposta para os diversos relatórios sobre o combate à fraude e evasão fiscais, entregues anualmente no Parlamento.

Em 2007, apenas 36 por cento das quase 400 mil empresas registadas declararam ter proveitos para pagar IRC.

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FONTE: PUBLICO
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