A responsabilidade tributária dos órgãos de gestão e fiscalização das pessoas colectivas - dos ROC e TOC

Sobre o assunto em epígrafe, e sempre salvo melhor opinião, é este o meu entendimento.

No que se refere aos órgãos de gestão de pessoas colectivas e entidades legalmente equiparadas, dispõe, a este respeito, o n.° 1 do art.° 24.° da Lei Geral Tributária (LGT) o seguinte “Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:

a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período do exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;

b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento”.

Da sua leitura resulta uma clara separação em dois tipos de dívidas tributárias, por um lado, aquelas cujo facto gerador ocorreu durante o período do exercício do cargo e bem assim aquelas cujo facto constitutivo ocorreu antes desse período e cujo prazo legal de entrega ou pagamento vai ocorrer depois deste. Por outro, aquelas, independentemente da data de ocorrência do facto gerador, cujo prazo de entrega ou pagamento ocorre durante o período do exercício do cargo.

Administradores, directores ou gerentes

Relativamente às primeiras, a responsabilidade só pode ser exercida depois de a administração fiscal provar que foi por culpa do administrador, director ou gerente que o património social se tornou insuficiente.

Já no que se refere às segundas, verifica-se uma inversão do ónus da prova, significando que, para afastar essa responsabilidade, quem tem de provar que não tem culpa na falta de pagamento são os administradores, directores ou gerentes [1].

Ou seja, em face das disposições que vigoraram anteriormente nesta matéria [2], verifica-se uma distribuição do ónus da prova que parece mais equilibrada, mas que está longe de ser consensual, especialmente tendo em conta que em muitas situações a prova de ausência de culpa pode transformar-se numa autêntica “prova diabólica” [3], difícil e onerosa para os administradores, directores ou gerentes, a quem se recomenda, em consequência, nesses casos, a existência de evidência de que fizeram tudo o que estava ao seu alcance para cumprir os seus deveres tributários.

A este respeito, refere Casalta Nabais, a exigência da prova de ausência de culpa não é conforme com os princípios da igualdade e da proporcionalidade, pois assenta numa inadequada ponderação entre os bens jurídicos constituídos: de um lado o interesse público na arrecadação de impostos que está por detrás da responsabilidade dos administradores e gerentes, e, de outro, pelos diversos direitos destes particulares (direito propriedade e de liberdade de iniciativa económica ou empresarial). Acrescenta que “estamos perante uma situação cujo grau de injustiça impressiona sobretudo pelo facto de, por essa via e sem que o Fisco retire daí qualquer proveito visível, a administração ou gestão das sociedades se converter, em certa medida, numa actividade de alto risco que ou afugenta os administradores ou gestores sérios ou fomenta os mais variados e imaginativos expedientes lícitos para obstar à aplicação de tão severos efeitos.

Revisores Oficiais de Contas (ROC)

Quanto aos membros dos órgãos de fiscalização e revisores oficiais de contas, dispõe o n.° 2 do art.° 24.° da LGT que são também subsidiariamente responsáveis nos termos atrás indicados “os membros dos órgãos de fiscalização e revisores oficiais de contas nas pessoas colectivas em que os houver desde que se demonstre que a violação dos deveres tributários destas resultou do incumprimento das suas funções de fiscalização”.

Aqui, retomando o regime já existente em face do art.° 13° do Código de Processo Tributário, o ónus da prova é da administração fiscal e dirige-se compreensivelmente às funções de fiscalização que, cabe a estas pessoas, estando a responsabilidade dependente de se conseguir provar um nexo de causalidade entre violação dos deveres tributários e incumprimento daquelas funções de fiscalização.

Técnicos Oficias de Contas (TOC)

Já quanto aos técnicos oficiais de contas o n.° 3 do citado art.° 24.° da LGT prescreve que os mesmos são também subsidiariamente responsáveis nos termos que vêm sendo mencionados “em caso de violação dos deveres de assunção de responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal ou de assinatura de declarações fiscais, demonstrações financeiras e seus anexos”.

Este nº 3 do artigo 24º teve uma alteração com a Lei 60-A/2005 de 30 de Dezembro [4] desaparecendo a menção à violação dolosa e acarretando, agora, que os TOCs respondem mesmo que não tenham actuado dolosamente, isto é respondem mesmo a título de negligência. No entanto, o ónus da prova cabe à administração fiscal.

Sobre este assunto, não posso deixar de referir que, em minha opinião, a lei é muito genérica quanto ao tipo de deveres aqui em causa, aludindo à responsabilidade pela regularização técnica nas áreas contabilística e fiscal e assinatura de declarações fiscais e mapas contabilísticos, não concretizando, inequivocamente, a sua abrangência.

Sendo certo que se trata de uma simples opinião, a minha, deixo no ar algumas interrogações, e se o entendimento da Administração Fiscal for outro, não faltam casos em que a referida recorreu a este expediente para procurar receber dívidas dos sujeitos passivos [5], não seria melhor clarificar o normativo em causa.

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[1] Trata-se neste último caso de uma “presunção de culpa”, compreensível, no entendimento de Manuel Henrique Pereira, em face do disposto no nº 32.° da LGT que estabelece em relação aos mesmos a incumbência de cumprir os deveres tributários das entidades por si representadas.
[2] Artigo 13º do CPT.
[3] Diabolica probatio.
[4] Lei do Orçamento de Estado.
[5] De realçar que a própria Administração Fiscal reconheceu que se tratavam de diligências feridas de legalidade, no entanto, e com esse procedimento, alguns serviços de finanças demonstraram não ter esse entendimento.

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